quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Por que continuar protestando no Twitter?

Segundo estudo da FGV, o Amapá está entre os cinco estados com maior índice de exclusão digital – ao lado de Roraima, Tocantins, Maranhão e Piauí. José Sarney é senador pelo Amapá. Vice de Tancredo Neves, ele assumiu a presidência da República depois de ter construído sua carreira no Maranhão.

Se o eleitorado de Sarney não tem acesso ao computador, de que adianta protestar no Twitter? Se o Senado brasileiro não liga para o que circula na web brasileira, o presidente da casa não cairá nem via eleitorado, nem por cassação. Renúncia já está fora de cogitação. Pra que gastar 140 caracteres se revoltando?

Eis aqui alguns motivos:

Antes da decapitação vem a reclamação

“Se o povo não tem pão, dê-lhe brioches!”, disse a rainha francesa Maria Antonieta pouco antes de seu fim na guilhotina em 1793. A frase veio depois de uma camareira alertá-la sobre pobres que vieram pedir comida em frente ao palácio. A fome virou a Revolução Francesa de 1789.

Li hoje um manifesto no PavaBlog pedindo que as pessoas abandonassem o Twitter e fossem protestar nas ruas. Ok. Concordo. A questão é: haveria este desabafo caso não houvesse "protestagem" no Twitter? Sem os internautas insatisfeitos e preguiçosos que reclamam colados nas cadeiras, dificilmente o assunto seria tão comentado como segue.

Sem a repercussão, não haveria sequer a ideia e o sentimento de necessidade de um manifesto mais estruturado e eficaz. Antes de um movimento organizado, sempre existe o esbravejar coletivo e caótico do banco de praça. No próximo sábado, haverá protestos por todo Brasil.

O Governo é sempre mais lento que a iniciativa privada

Os governantes não ligam para o que falam a blogosfera e os internautas brasileiros. E daí? Eles vão aprender a ouvir. Sempre demora um pouco mais para eles prestarem atenção nessas coisas. Ano que vem tem eleições. Quando ficar comprovado que o buzz da internet influencia o voto, a história vai mudar.

Internet não é brincadeira e quem se ligou disso já está colhendo frutos. A Tecnisa já utiliza o Twitter para vender apartamentos, embora no início deste ano seus diretores não acreditassem nesta possibilidade. Empresas como a E.life se dedicam a monitorar o que clientes falam a respeito de produtos nas mídias sociais.

A iniciativa privada já percebeu o poder destruidor (e também construtivo) de reputações que tem a web 2.0. Políticos e Estado perceberão isto aos poucos.

A sensação enganosa causada por Fora Collor e Diretas Já!

Eu me pergunto sobre o real engajamento das gerações que participaram do Fora Collor e Diretas Já!. Falam como se tivessem realmente feito um estrondoso impacto político e como se fosse um grupo de jovens altamente politizado.

Alguns fatos levam à direção oposta. Há um sem número de casos de corrupção da mesma época do “Caso PC Farias” que não geraram nem de longe a mesma comoção que culminou com o Fora Collor. E, quando perguntamos aos caras-pintadas sobre eles, muitos nem sabem do que se trata.

Uma breve lista. CPI do Orçamento, Máfia dos Gafanhotos, Escândalo do Sivam, Dossiê Cayman, Caso Cacciola, quebra de empresas como: Mappin, Mesbla, Banestado, Encol. Assassinatos como os de Toninho do PT e Celso Daniel.

Propinoduto, valerioduto e mensalão coroam a sensação enganosa deixada pelo Fora Collor. Nem sempre as manifestações de rua geram bons resultados ou mesmo terminam em acontecimentos evidentemente melhores do que os protestos via web.

Creio ser razoavelmente consensual que o Movimento Cansei, por exemplo, obteve resultados menos expressivos do que o #forasarney.

O engajamento virtual e suas implicações reais

Não se sabe ao certo qual o grau de comprometimento que um usuário do Twitter que posta #forasarney realmente tem com a causa. É impossível saber também o quão politizado ele é. Segura afirmar é que o interesse nos assuntos de política nos últimos meses cresceu.

O papel da mídia social, neste caso, foi de dar voz a quem queria falar, mas nunca soube como. Ao se sentir participante da conversa, o internauta buscou por um grau maior de informação, que gerou mais indignação, que pode acabar em ações políticas efetivas.

A queda de Sarney não basta para termos um Brasil melhor. Não sei nem se ele vai cair ou não. A participação da sociedade civil em atos políticos, entretanto, é extremamente salutar para um regime democrático minimamente decente.

4 comentários:

Janeth Rego disse...

Eu só acho que o nosso povo é muito lerdo. Se é pra tirar o cara do poder, que leve ovos e paus, paus e pedras, tudo para a porta do senado.

Só sob chuva que essas víboras saem do poder.

nílcea c. trigo disse...

Lavei a alma com o seu post!
Tenho pensado muito nisso e seu texto me ajudou bastante. Inclusive me encheu de esperança.
só acho que deveríamos alterar um pouquinho o protesto para: #forasarneyetodaessacambada
abs <><<

Celia Rodrigues disse...

Concordo que o povo deve se movimentar, se manifestar e fazer jus à sua condição de estado democrático. Eu só não creio que isso vá promover alguma mudança. Não acredito num Brasil justo, em mudança social, em política limpa. Infelizmente, não acredito.

Kennedy Lucas disse...

Ótimo texto. Achei muito interessante seus argumentos para defender o uso de midias sociais em protestos políticos. Sem dúvida nenhuma, eles serão muito imporantes em 2010.